sete dias
sete dias como a seven days diet. como a vela de sete dias.

Sete Dias antes
03/01/2004 - 04/01/2004 04/01/2004 - 05/01/2004 05/01/2004 - 06/01/2004 06/01/2004 - 07/01/2004
cada dia uma coisa
sexta-feira, maio 28, 2004

A mão à palmatória

...E a claque decidiu a Palma de Ouro de Cannes. Farenheit 9/11, ganhou o prêmio máximo do Festival, além de ser também o detentor do recorde de filme mais aplaudido em todos os 57 anos de mostra competitiva cinematográfica na Riviera Francesa (como dito semana passada nesta coluna). Menos sorte teve Diários de Motocicleta – que alguns críticos, como Roger Ebert, do Chicago Sun Times insistem em chamar de brasileiro: nenhum prêmio do júri oficial.

Felizmente, a discussão não ficou em torno de quantas-palmas-valem-uma-palma. O talk of the town em Cannes foi, sim, a Palma de Ouro para o filme de Michael Moore. Mas questionava-se não o aplauso, e sim o fato de o júri ter sido supostamente influenciado pela grande dose de política do filme, não ter prestado muita atenção em aspectos artísticos e, o mais grave, ter premiado um filme que utiliza imagens de televisão! A polêmica foi tanta que o júri, pela primeira vez na história de Cannes, promoveu uma coletiva de imprensa logo após o anúncio dos vencedores, para explicar por que Farenheit 9/11 mereceu levar a maior honraria do Festival.

Ao longo das duas semanas, os jornalistas que cobriram o evento falaram tanto, mas TANTO do documentário, que até dúvidas sobre se o filme poderia levar o carimbo de "cinema" surgiram. Kleber Mendonça Filho, do Jornal do Commercio e do CinemaScópio, chama a obra de Michael Moore de "cinejornal", num tom um tanto pejorativo. Ele explica que é porque 90% das imagens utilizadas são advindas de telejornais, portanto o filme não poderia ser considerado CINEMA (conclusão tirada por mim ao terminar de ler o texto de KMF; alguém me corrija se estiver errado).

Acho complicada essa questão. Definitivamente, não existe uma regra que limite o que é e o que não é cinema. Pessoalmente, acho que o que define cinema é a edição, a montagem, a forma como aquelas imagens são mostradas, não importa de onde elas venham. É aí que o narrador mostra a que veio, é por meio da edição que o cineasta conta bem ou mal a sua história. Mesmo filmes como Festim Diabólico (cujos oito cortes não são perceptíveis) e Arca Russa (todo filmado em plano seqüência) trazem a edição, ou melhor, a falta dela, como ponto alto. Mesmo ausente, a montagem está lá, planejada anteriormente quadro a quadro.

É esquisito tratar o filme de Moore como algo "menor" por ele ter usado imagens previamente gravadas e exibidas pela televisão. Ora, não lembro de ter visto ninguém reclamando de Na Captura dos Friedmans ou Nós que Aqui Estamos por Vós Esperamos por terem usado imagens de home movies ou de arquivo televisivo. Isso sem falar no excelente Ônibus 174, filme que todos já tinham visto em suas casas, no Plantão da Globo e, ao mesmo tempo, NÃO tinham visto. A forma com que os diretores José Padilha e Felipe Lacerda montaram as várias horas de imagens "ao vivo" fez com que toda a tensão fosse revivida, com que a problemática mostrada fosse repensada, mesmo com o início, o meio e, principalmente, o fim sendo de conhecimento de todos. E, se não me falha a memória, nenhum crítico reclamou - muito pelo contrário.

Michael Moore é um cineasta longe, muito longe da perfeição. Seus documentários deveriam trazer sempre várias aspas, pois Moore menos documenta que induz o espectador a pensar da forma que ele acha correta. O cara manipula descaradamente não só as imagens (um dos diálogos dele com Charlton Heston em Tiros em Columbine foi enxertado sem a presença do ator) quanto os personagens (toda a seqüência do Wallmart, também em Columbine) dos seus documentários, algo que causaria calafrios em muitos documentaristas. Não é à toa que Tiros em Columbine ganhou, no ano passado, o prêmio de Melhor Roteiro da Associação de Roteiristas dos EUA – troféu que, até então, só tinha sido entregue a filmes de ficção. Talvez os filmes de Moore estejam bem mais próximos da ficção que da realidade. Mas, ao que parece, ele não está nem aí para os rótulos. E talvez esse seja o problema dos jornalistas em polvorosa no Festival de Cannes: tentar classificar o tal do Farenheit 9/11. Talvez Tarantino e sua trupe tenham enxergado além e decidido premiar algo inclassificável, mas com muito valor artístico.

P.S.: A atriz inglesa Tilda Swinton, membro do time de jurados de Cannes nesta edição, revelou que quase foi dado um prêmio de Melhor Contribuição Humorística para George W. Bush.

P.S.2: Quero deixar claro que ainda não assisti ao filme em questão (que, aliás, estréia nos em Julho no Brasil). Quis discutir o teor das críticas contra o filme – quase todas baseadas no fato de o filme ser ou não cinema, se é justo ou não um filme que usa imagens de TV levar um dos prêmios mais prestigiados do cinema. Quanto à qualidade artística, é esperar para ver se a opinião dos jurados coincide com a minha.

P.S.3: Acabo de sentir que não consegui colocar nessas linhas a minha linha de pensamento. Reescrevi, mas mesmo assim na minha cabeça soa todo muito mais coerente. É torcer pra que vocês esqueçam a (falta de) qualidade jornalística/literária do texto e comentem só as idéias contidas nele.


Fábio Leal @ 9:03 PM

quinta-feira, maio 27, 2004

Grandes complicações trazem grandes responsabilidades - Parte III


Parte final da saga. "Até que enfim", vocês devem estar pensando. Foi mal se o papo tá chato - cheguei a essa conclusão pela ausência de comentários no texto anterior. Mas este texto é pra concluir e amarrar tudo que eu vinha falando até aqui. Tudo começou com a pergunta "por que quadrinho não é tão popular quanto poderia ser?", depois abordamos alguns aspectos culturais da mesma questão. Agora o papo será sobre grana, bufunfa. O supervilão mais poderoso das nossas vidas.

O tradutor de quadrinhos Jotapê Martins definiu bem isso: quadrinho é a mídia mais barata, e ao mesmo tempo, a mais cara dos tempos modernos. Ora, para termos uma história da maneira mais simples, do que precisamos? Um artista, um lápis e um papel, não? Pois bem. Agora coloque aí na mistura os demais fatores do mundo capitalista. Os resultados são os piores possíveis.

Comecemos pelo papel. O papel-jornal, utilizado na maioria do material publicado, é cotado pelo dólar, e por tabela vive sujeito às oscilações da moeda. Quase todas as HQs hoje são a cores; com uma impressão mais cara, já sai perdendo em comparação ao segmento de livros. Imagine então as HQs de luxo, em papel couchê colorido, e aí você entende porque ainda tem tão pouco quadrinho de qualidade nas livrarias. Quanto aos gibis nas bancas, estas precisam vender mais ou menos 80% dos exemplares. Num país imenso como o Brasil, uma tiragem nacional é bem grande, aumentando assim o problema...

Outra coisa é a publicidade, nos dois sentidos: para anunciar a revista e anunciar na revista. No primeiro caso, já faz um bom tempo que as editoras não tem capital pra investir no marketing de seus próprios lançamentos. Outdoor, rádio, TV? Nem sonhando. Cartazes colados na banca? Raramente. No outro caso, só quem anuncia em gibi - isso quando anuncia - são fabricantes de brinquedos ou de alimentos para crianças e jovens.

"Ah, então o que deve salvar os quadrinhos são as vendas, não é?" No way, man. Nos últimos dez anos, surgiram no campo de batalha mais três comparsas do nosso supervilão: a Internet, as TVs por assinatura e o entretenimento eletrônico (videogames, portáteis e jogos para computador). Embora cada um deles tenha um objetivo comercial que não chega a ser exatamente o mesmo das HQs, não há como negar que muito leitor na faixa infanto-juvenil prefira hoje o seu monitor a um gibi. E aí cria o famoso efeito Tostines: as revistas ficam mais caras porque não vendem, e não vendem porque ficam mais caras.

Uma revista em quadrinhos de 100 páginas custa hoje cinco reais. Um garoto brasileiro de classe baixa teria que ficar dois ou três dias economizando o dinheiro do lanche para consegui-la. Tem quem pague por esse preço sem pesar no bolso? Tem: as classes média e alta, que a essa altura, já está bem mais interessada nos games e desenhos da TV a cabo. Daí o quadrinho não expande seu público. Pelo contrário, vai ficando com foco de atuação cada vez mais restrito, contando apenas com o apoio dos consumidores mais antigos e que tenham um salário razoável para bancar esse pequeno luxo.

****

Como tudo chegou a esse nível? É uma história bem longa, portanto vamos focar apenas no Brasil por enquanto. Basicamente, a "culpa" é de Roberto Marinho e Victor Civita, os todos-poderosos da Globo e Abril, respectivamente. Não, eles não criaram nenhum plano maquiavélico no estilo "Collor venceu o debate de 1989". Na verdade, o quadrinho nacional deve muito a estes senhores.

A Rio Gráfica, editora do Seu Marinho, criou em 1939 o Gibi, suplemento do jornal O Globo, que foi um tremendo sucesso e até hoje é sinônimo de revista em quadrinhos no Brasil. Depois, já com o nome Globo, a editora foi responsável por dar continuidade ao sucesso da Turma da Mônica (eles eram da Abril nos primeiros anos) e também consagrou no Brasil a série Sandman, dando um grande impulso ao segmento de quadrinhos para adultos.

Já o Seu Civita lançou em 1950 a revista O Pato Donald, cujo protagonista dispensa apresentações. Mas o detalhe é que essa revista não foi apenas o primeiro quadrinho publicado pela Abril: foi a primeira revista, a estréia da Editora Abril como um todo! Até hoje, a empresa é considerada uma das maiores editoras Disney do mundo e depois cresceu no ramo dos super-heróis da Marvel e DC - que atualmente são publicados no Brasil pela editora multinacional Panini.

O lado ruim dessa história toda é que os dois empresários acabaram criando, meio que involuntariamente, uma série de tabus e vícios na área. As altas vendas da Mônica e da Disney, universos com enfoque infanto-juvenil, fizeram muita gente crer que esse tipo de quadrinho dá certo no Brasil. Em vez de investir na produção nacional, as editoras ficaram mal acostumadas a comprar o material dos EUA, que é revendido em larga escala - e a preços baixíssimos - para muitos países. Aí o que acontece? Aquilo que eu disse na coluna anterior. Sem histórias com a cara do Brasil - e levando em conta os demais pormenores econômicos citados acima - fica bem mais difícil pro leitor brasileiro se familiarizar com HQs.

No Brasil a situação é essa, mas surpresa!, no resto do mundo não está tão diferente. Não está tão ruim como aqui, mas tanto o fenômeno da concorrência com as mídias eletrônicas quanto a ascensão avassaladora dos quadrinhos japoneses estão esmigalhando os demais mercados locais. Editores dos EUA e França já andam bem preocupados com isso; principalmente os EUA, cujo gênero mais popular - os super-heróis - estão em uma profunda crise criativa (tema para outra coluna).

Ufa... e aí? Depois disso tudo, alguém quer ir na banca comprar uma revistinha pra se distrair?

****

Era isso. Mais uma vez, desculpem se o blablablá ficou acadêmico, comprido ou chato demais. Mas a próxima coluna será diferente, eu prometo. We're gonna have some fun tonight!

P.S.: Curiosamente, a Panini está reajustando o preço de suas revistas neste mês. O motivo? Aumento do papel...

P.S.2: O Festival de Quadrinhos de Pernambuco tá aí. Passem na Torre Malakoff e confiram. Comento aqui depois o que achei da edição deste ano.

P.S.3: Dando continuidade ao meu plano de dominação global, a partir da semana que vem estarei toda terça-feira no Sete Dias, substituindo o colega Jorge Wakabara.

MPadrão @ 3:22 PM

sexta-feira, maio 21, 2004

Palmas de Ouro

Amanhã acaba a edição 2004 do Festival de Cannes, com a entrega da Palma de Ouro. Mas, com o perdão do trocadilho, a premiação máxima poderia se chamar Palmas de Ouro – pelo menos nesse ano. É que as notícias que chegam de lá dão a impressão de que Cannes se transformou num grande programa de auditório: quase todas as reportagens e críticas trazem junto o tempo de aplausos que cada filme recebeu. E é assim que os jornalistas estão medindo o impacto dos filmes sobre o júri: como num Topa Tudo por Dinheiro de Sílvio Santos. Segundo o aplausódromo, o campeão até agora é o "documentário" Farenheit 9/11, de Michael Moore, com uma ovação de 20 minutos, seguido pelos 13 minutos de palmas para o "nosso" Diários de Motocicleta (é assim que Arnaldo Jabor e Artur Xexéo se referem ao filme de Walter Salles – mesmo o filme tendo sido produzido pelos EUA e Inglaterra, sendo falado em espanhol, filmado na Argentina, Chile e Peru, baseado em livro de dois argentinos e não tendo nenhum brasileiro no elenco). Isso me fez lembrar um concurso de "quem bate palma mais alto" do qual participei, no colégio, há alguns anos – e saí vencedor. Finalmente achei uma função para esse meu dom, além de irritar os amigos. Estúdios de Hollywood com filmes em Cannes: estou à disposição.

* * *

Depois de Romance, Intimidade, Ken Park e Brown Bunny, vem aí o novo filme-polêmico-por-suas-cenas-de-sexo-explícito. Chama-se 9 Songs e intercala as supracitadas cenas explícitas com clipes. Entre os vídeos musicais, um Dandy Wahrols e um Super Furry Animals. Entre as modalidades sexuais, um "fellatio" e um "cunnilingus" (segundo a Variety, que é um periódico de respeito, assim como o Sete Dias). O diretor é o britânico Michael Winterbottom, do chatérrimo 24 Hour Party People. Torço pra que esse 9 Songs não se passe em Manchester.

* * *

Pra terminar ainda no embalo de Cannes, um questionamento: será que os festivais são mesmo os melhores lugares para ver filmes? Até que ponto ser uma "vitrine pra trocentos filmes" é uma coisa boa? Será que dá pra dar a atenção que um filme precisa, para apreciá-lo, entendê-lo, enfim, sentí-lo, vendo três, quatro por dia? Descobrirei isso em outubro, quando for pra Mostra BR de Cinema, em São Paulo. (Tá, essa última parte foi só pra deixar alguns com inveja).


Fábio Leal @ 8:40 PM

quinta-feira, maio 20, 2004

Laricas memoráveis

O causo de hoje é na verdade uma compilação das melhores histórias de larica que eu já ouvi. Claro, não darei nome aos bois, mas garanto que os personagens realmente fazem jus às maluquices aqui relatadas.

1.
Ano de intercâmbio, lá pelos idos de 60 e tantos. Twiggy ditando moda, e as moçoilas fazendo de tudo para ficarem esquálidas como a modelo. Aí um dia, Judith resolve experimentar um baseado com os amigos gringos, só prá ver no que dava. Aquela coisa, pais longe, auge dos 17 anos, tinha que fazer lá, porque aqui era transgressão.
Fumou, bateu, ficou louca e... caralho, que fome! Foi ver o que tinha na geladeira da host-family. Hmm... nhoque! Tá gelado, mas deve estar delicioso!
Realmente estava. Na hora. Depois, passada a onda, viu o atentado à magreza que havia cometido e a dor de barriga que vinha a galope. Dedo na güela, já!

2.
Trio parada-dura, sempre com um baseadinho pronto para todos os momentos. Tarde de sábado, casa vazia, filme de terror no vídeo, o momento era aquele (e todos os outros também). Na hora que a fome bateu, o jeito foi recorrer às sobras da geladeira própria de mãe que viaja no fim de semana. Encontraram o maior tesouro: bisnaguinhas, maionese e uma garrafa de Fanta. A metida a gatrônoma do grupo sugeriu. E se a gente pusesse as bisnaguinhas no microondas? Maldita boa idéia. Esvaziaram o saquinho de pães numa tarde, mais a garrafa de refrigerante.
Contam que as alucinações que tiveram com o assassino do filme foi culpa da maionese.

3.
As amigas voltaram do arrabalde onde iam receber Jah, em direção a cidade. O caminho longo era prá recuperá-las do baque “religioso”, assim ninguém comentava pelas ruas. Chegaram na casa de uma delas e se depararam com um cacho de bananas. Mandaram ver. Foi a banana mais gostosa da vida delas, docinha, durinha, cremosa na boca. Seis bananas cada uma. No outro dia, alucinações com a cor amarela e o nome da fruta. Além de, claro, um belo piriri-gangorra.

4.
Prá finalizar, combinações deliciosas já praticadas:
- Presuntinho Piraquê com molho barbecue e honey mustard
- Frango empanado no forno, às 4 da manhã
- Nescau puro (naquela boca seca? Ugh!)
- Yakissoba gelado
Deu prá embrulhar o estômago? Missão cumprida, até quinta que vem que vem.


Bia Bonduki @ 9:54 AM

sexta-feira, maio 14, 2004

"Os clássicos não têm idade"

Trabalhar numa locadora parece, a princípio, um paraíso para um "cinéfilo" (entre aspas porque odeio essa palavra). E é – mas só nos primeiros dias. Uma penca de filmes para ver, sem pagar nenhum centavo. Todos os lançamentos super aguardados por todo mundo ali, ao meu alcance. Mas depois de algumas semanas com uma média de dois filmes vistos por dia, começa a bater uma agonia. Eu olho para as prateleiras e nada me apetece. O tiro de misericórdia foi dado quando eu peguei pra ver O Assalto, de David Mamet. Como o título diz, é um filme-de-roubo, com planos mirabolantes, trapaças, reviravoltas na trama e o indefectível "final surpreendente". Ok. No dia seguinte, chega na locadora um filme chamado Uma Saída de Mestre, com Mark Wahlberg e Edward Norton. Boto pra ver. Ôpa! Filme-de-roubo, planos mirabolantes, trapaças, reviravoltas e, tcharam!, final surpreendente. Depois disso, resolvi que ia passar um tempo só revendo filmes.

Minha primeira parada, não sei por que, foi na seção Infantil. Fiquei lá olhando os filmes e, ao olhar a capinha de Mary Poppins, fui tomado de um sentimento de nostalgia, de saudade mesmo. Fiquei lembrando dos filmes que eu gostava quando era pequeno – e se gostaria deles hoje em dia. Levei Mary Poppins pra casa.
Sim, sim, sim, a babá com guarda-chuva voador ainda consegue me encantar. Tudo bem, certas seqüências, vistas hoje, não tem graça nenhuma, mas a lembrança de que eu achava graça há doze anos já me basta. E, por falar nessa lembrança, é por causa dela que eu revi o filme duas vezes agora: uma com o som original e outra com a versão dublada. Que me perdoem os puristas: a versão dublada me emociona mais. Supercalifragilisticexpialidoce/Sente o som dessa palavra/Não é nada doce/A criança que falar vai parecer precoce/Supercalifragilisticexpialidoce!. Diga aí, rimar doce com precoce é uma forçada de barra da gôta, mas essa é a versão certa da música, segundo os recantos infantis do meu cérebro.

A vida depois da babá

Depois de Mary Poppins, lembrei dos outros dois filmes que fecham meu Top 3 dos 6 aos 10 anos.

Alguém aí lembra de Mestres do Universo? Foi a versão em carne, osso e músculos de He-Man, feita em 1987, com Dolph Lundgren no papel principal (nosso querido comentarista Magnata ainda era muito novinho para interpretá-lo na época). Revendo o filme em fast forward na minha cabeça, vejo que não existe coisa mais retrô que esse filme. Pra quem não lembra, o "artefato mágico" do filme (existente em 8 entre 10 filmes infantis), no caso uma tal de "chave cósmica", era um aparelhinho eletrônico com centenas de luzinhas piscantes e uma musiquinha à lá Jean-Michel Jarre tocando. Mais 80s, impossível. Isso sem falar nas armas à laser e nos skates voadores, totalmente na moda na época por causa de Star Wars e De Volta para o Futuro.

Fechando a coluna de hoje vem o meu filme mais querido quando pirralho – tema de vários dos meus sonhos na época. Chama-se Os Heróis Não Têm Idade e é um verdadeiro clássico da Sessão da Tarde.. Nesse filme, o garoto de E.T., Henry Thomas, é um menino que perde a mãe e acaba criando um amigo imaginário (que, não por acaso, é interpretado pelo mesmo ator que faz seu pai). A história começa quando Thomas compra um cartucho de Atari no qual está escondido o plano de construção de um avião-espião. É claro que o menino e seu amigo entrarão EM APUROS pois uma GANGUE MUITO LOUCA estará atrás dele, prometendo ALTAS CONFUSÕES E MUITA ADRENALINA. Apesar da locução do carinha da Globo, eu não me divertia nada com esse filme. Quem já o assistiu, sabe que a velhinha de três dedos é um dos personagens mais assustadores de todos os tempos. Este aqui eu não tenho coragem de rever, acho especial demais pra ser destruído pelo meu diplomado Olhar Crítico. Prefiro continuar lembrando dele como O Melhor Filme de Todos os Tempos Até Meus Oito Anos de Idade.

Só pra ser clichê, finalizo com um: e vocês, quais eram os seus filmes favoritos quando pirralhos?

Fábio Leal @ 10:00 PM

quinta-feira, maio 13, 2004

Grandes complicações trazem grandes responsabilidades - Parte II


Estão prontos? Sentem-se e leiam, porque a conversa vai ser cheia.

Oficialmente falando, os quadrinhos existem há pouco mais de 100 anos. Foi quando um tal de Richard F. Outcault lançou o Yellow Kid na publicação "The New York World", em meados de 1895. Ao longo das décadas, os quadrinhos alavancaram as vendas de jornais, migraram para revistas próprias até se valorizarem enquanto arte e se lançarem em edições de luxo intituladas graphic novels. Todos esses formatos perduram até hoje e já surgem outros, como os quadrinhos online.

Não tenho estatísticas precisas, mas os países que mais consomem quadrinhos são o Japão (provável primeiro lugar), Estados Unidos, França, Inglaterra, Itália e Bélgica. Hoje o mercado mundial é bastante diversificado, atendendo dessa forma à demanda de público de cada região. Cada país é um caso: se os Estados Unidos fabricam super-heróis e conseguem vendê-los em outros mercados (como no Brasil), os mangás japoneses atingem principalmente o público infanto-juvenil com seus Pokémons e Dragon Balls. E os europeus vendem aos adultos coleções de luxo que, não raro, trazem temas "polêmicos" como sexo e violência.

Aonde eu quero chegar com tudo isso?

No texto passado, abri a discussão de que muitas das dificuldades de difusão dos quadrinhos enquanto arte e mídia têm raízes culturais. Desta vez, usei dois parágrafos para introduzir isso: um falou da trajetória e formatos desse meio, e o outro, da expansão geográfica e variedade de estilos do mesmo. Portanto, o modo como os quadrinhos se desenvolveram em cada país têm ligação direta com a forma como cresceu a indústria cultural nesses locais.

Nos Estados Unidos, os quadrinhos quase sempre foram considerados mais uma forma de ganhar dinheiro. Só para citar um exemplo, o tal Yellow Kid que citei acima só conseguiu decolar quando o megaricaço William Randolph Hearst passou a utilizar a tira para alavancar as vendas de seus jornais. A Marvel e a DC (vocês vão ler muito esses dois nomes aqui, aguardem) matam, ressuscitam e entroncham seus super-heróis conforme a maré de vendas das revistas. E por aí vai.

O Japão é ainda mais radical. Os mangás são comercialmente levados muito, muito a sério. Lá eles criam revistas e personagens já pensando milimetricamente no seu público-alvo. Eles têm gibis para as meninas classe C de 15 a 17 anos até os yuppies acima de 35 anos. Já na Europa, a maior parte dos consumidores de quadrinhos são bastante elitistas. Não compram gibis, e sim álbuns de tratamento editorial de primeira nas livrarias, com histórias fechadas e temáticas "adultas". A revista Metal Hurlant (Heavy Metal no Brasil e EUA) é o exemplo clássico da produção de lá.

E no Brasil? Pff...

Não por acaso, os países que mais lêem quadrinhos são também os que mais produzem. E quando produzem, eles conseguem consolidar um mercado com a cara deles. Os americanos se identificam com o Super-Homem, os japas se identificam com Goku. No Brasil, Maurício de Souza, Ziraldo e Angeli atingiram o sucesso popular mas, por diversos motivos, não foram o suficiente para fortificar e personalizar o nosso mercado. Como bom exemplo, Mônica tem lá suas características locais, mas o conceito geral tem influência nítida da Luluzinha dos EUA.

No frigir dos ovos, boa parte dos leitores brasileiros ainda não reconhece identidade nos quadrinhos publicados aqui porque a maioria esmagadora é produção de fora. Afinal, o assalariado sai do trabalho no fim do dia, passa na banca de revistas e tudo que vê são babacas fortões pintados com a bandeira dos Estados Unidos, patos vestidos de marinheiro, um rato amarelo e mané que só fala a mesma palavra e uma dentuça que só faz bater nos outros com um coelho de pelúcia... ele simplesmente vai botar as mãos na cabeça e pensar: "pra quê eu vou ler essa porra se isso não tem nada a ver com a minha realidade?".

Ou se muito, ele pode simpatizar com a dentuça e comprar uma revista dela para o filho de três anos. A duras penas, porque o preço do tal gibi é equivalente a duas passagens de ônibus. Mas isso fica para a próxima coluna.

MPadrão @ 6:18 AM

terça-feira, maio 11, 2004

A ilusão do ciberespaço
por Jorge Wakabara

O editor e o leitor vão me dar licença pra eu fugir do tema, porque agora eu só penso nisso, só respiro isso, acordo, escovo o dente e estou lá, com uma plaquinha na testa: PESQUISADOR.
Hoje em dia, pós-Pierre Lévy e o seu texto give-the-web-a-try "A Revolução contemporânea em matéria de comunicação", todo mundo acha que fazer pesquisa é coisa pra macaco treinado. Afinal, para que mesmo existe o amigo Google? O Altavista? O Yahoo? E veja só, existe uma opção para você REFINAR SUA PESQUISA! Facinho, né? "Just do it"!
Ah, e na web tem de tudo! Segundo as próprias palavras de Lévy, "um computador e uma conexão telefônica dão acesso a quase todas as informações do mundo, imediatamente ou recorrendo a redes de pessoas capazes de remeter a informação desejada". Não é incrível? Eu posso entrar em contato com pesquisadores do Japão, eu posso entrar em bibliotecas virtuais, eu sou A PESSOA MAIS PODEROSA DO MUNDO E TENHO TANTO ACESSO À INFORMAÇÃO QUANTO O PESQUISADOR MAIS FODEROSO QUE JÁ EXISTIU!!!
É assim? Então. Não é assim.

O caminho já está aberto, mas o ciberespaço ainda não é a maravilha que parece. Quando a sua necessidade não passa de uma letra de música do Nirvana, é capaz até que você já a encontre traduzida, cifrada, etc e tal. Mas o que dizer de informações específicas? Possivelmente você pode encontrar artigos interessantes, mas o difícil é achar, por exemplo, coisas pontuais e simples, como uma ficha técnica de um filme lançado na década de 90. Você pode até encontrar uma ficha técnica, mas você confia cegamente naquela informação do www.imdb.com? Eu já encontrei milhares de erros por lá.
Para qualquer pesquisa científica, a respeitabilidade ainda se encontra nos livros e nos teóricos. Por mais que Lévy defenda que a descentralização da informação acontece em prol de uma coletividade e que melhora a qualidade das relações, e que o contexto imposto (ou seja, o centralizado, fora do ciberespaço) é um risco de "verdade oficial", não podemos deixar de lado que uma pesquisa baseada somente em dados levantados em sites diversos, com textos que não possuem assinatura, corre um risco muito maior de ser considerada inválida.
ALÉM DISSO, é muito mais difícil encontrar informações específicas sobre certos assuntos do que a gente imagina. Por exemplo: cinema. Um tema super palatável, sempre tem alguém que curte um filme e faz um site não-oficial. Certo? Errado. Tente procurar por "Lady in the dark", por exemplo, filme importantíssimo de Ginger Rogers no papel de uma editora dr revista que começa a fazer análise (detalhe: na década de 40! MODERNA!).
Achou? Então me passa. Porque na verdade essa coluna é pra dizer que EU NÃO TENHO TEMPO PRA FREQUENTAR BIBLIOTECA E A INTERNET NÃO MUDA A MINHA VIDAAAA!!!

***

E pra quem ama cinema e está em São Paulo: Largo Senador Raul Cardoso, 207, na Vila Clementino (o que na verdade quer dizer Vila Mariana um pouquinho pra lá).
A biblioteca da Cinemateca, por mais que não seja muito visitada, é aberta. Fica aberta das 9h às 13h, e você pode ir lá, passar uma conversa do tipo "estou pesquisando todos os filmes do Glauber Rocha para um trabalho da USP" e ter acesso a recortes de jornal, livros, material de divulgação e o escambau. O acervo deles é bom em filme nacional - dizem que o Centro Cultural da Vergueiro tem mais coisa estrangeira. Assim que eu conferir, digo pra vocês.

Fábio Leal @ 11:39 AM

quinta-feira, maio 06, 2004

O barbeiro que brocha

Esse causo é do vô Jairo, avô de uma amiga minha, quando seus filhos ainda eram pequenos e ele era o Pai Jairo. Sabe aqueles avôs que não têm papas na língua? Ele era assim, e usava disso prá educar as crianças. Deu no que deu: quem ouve os causos, morre de rir.

O pai barbeiro chegou cansado em casa, tomou um banho e calçou os chinelos. Era uma noite de semana, daquelas que você chega cansado e só quer ver a cara da cama. As crianças estavam na sala assistindo televisão debaixo das cobertas, quietas, para sua surpresa. Dopado de sono, o pai deu boa noite aos dois e foi se juntar à mãe no quarto. A glória: o descanso! A mãe já estava caída de bruços, com a cara no travesseiro, mas foi ele tirar o chinelo para deitar que a zona começou.
Em se tratando de irmãos, tarde da noite, e sem deixar de lado a Lei de Murphy, era previsível que eles iam começar a brigar bem na hora em que todos fossem dormir.
Um berrava:
- Ô paaaaaaaaai!!!
E a outra:
- Não fui eeeeeuuuu!!!!
O botão da televisão antiga girava fazendo um barulho alto de que ia quebrar. Tudo indicava que o motivo da briga era o maldito canal. Como se criança tivesse o direito de escolher o melhor canal às 11 da noite.
Com a cara afundada nas mãos e uma preguiça enorme de se exaltar, o pai se levantou da beirada da cama e foi caminhando lentamente até a sala. Olhou os filhos, que ainda se estapeavam, com um olhar sério e cheio de frustração:
- Sinceramente, como vocês esperam que eu consiga comer sua mãe com esta gritaria? Não há pau que levante com tamanho furdúncio!
As crianças olhavam o pai, estarrecidas. Dentro do quarto a mãe tapava a boca para não rir tão alto.
- Precisava ter dito isso para eles pararem?
- Espere os próximos meses de silêncio.
E assim foram as próximas noites, cheias de um silêncio curioso, de crianças falando “shh, quero ouvir”, tentando imaginar o que acontecia no quarto ao lado.


Bia Bonduki @ 2:27 PM

domingo, maio 02, 2004

Nós: os bodes expiatórios da Indústria Fonográfica

Recentemente, dois pesquisadores americanos, Felix Oberholzer-Lee e Koleman Strumpf, divulgaram um estudo onde defendem que a troca de música pela internet não tem efeito relevante na queda das vendas de discos. Segundo os autores, nas condições mais desfavoráveis possíveis, uma cópia de CD deixa de ser vendida para cada 5 mil downloads do álbum em questão.

O estudo foi realizado com base em relatórios fornecidos por uma das maiores redes de troca de arquivos na internet, a OpenNap. Isso deu ainda mais respaldo à pesquisa, já que nenhum outro estudo havia contado com dados tão precisos anteriormente (eles observaram 0,01% de todos os downloads efetivados no período entre 8 de setembro e 31 de dezembro de 2003 nos Estados Unidos).

A troca de arquivos na internet seria, portanto, o bode expiatório criado para justificar a queda na venda de CDs. A Associação das Indústrias Fonográficas da América (RIAA) se aproveita da aparente conexão entre as duas coisas para “se defender”, processando, só no último mês de março, 532 usuários nos Estados Unidos.

Duas grandes dúvidas, contudo, rondam a questão da queda nas vendas de CDs e sua eventual relação com a troca de arquivos na internet. Primeiro: filmes, softwares e videogames também são baixados pela internet, muitas vezes através das mesmas ferramentas que são usadas para baixar música, e, no entanto, seus respectivos setores continuam a crescer. Segundo, e mais importante: não é a primeira vez que as vendas da indústria fonográfica caem.

Entre o final dos anos 70 e o início dos anos 80, o mercado fonográfico também sofreu forte retração. Ele só iria voltar a crescer com a invenção do CD, que segundo Simon Frith (citado em “Rock N Roll – Uma História Social”, de Paul Friedlander), “salvou a indústria musical”. O CD revolucionou a indústria por dar margens de lucro muito maiores aos seus fabricantes. Em 1982, por exemplo, a venda de 53 milhões de CDs proporcionou faturamento similar à venda de 125 milhões de discos de vinil. Em contrapartida, o CD proporcionava qualidade de som limpa e cristalina, o que serviu de argumento para que coleções inteiras de LPs fossem convertidas para o novo formato. Só em 1983 é que a indústria fonográfica voltaria a crescer. Um dia, no entanto, a galinha dos ovos de ouro do disco compacto teria que se acomodar. É o que está acontecendo.

Além de o CD não ser mais novidade, o preço dos discos vêm subindo, o que é fator decisivo na queda da venda de discos. Mas a ganância da indústria fonográfica é tamanha que, ao invés de reduzí-los, ela prefere processar os usuários de programas de trocas de arquivos na internet, e culpar a nova tecnologia pela redução nos seus lucros extraordinários. Convencendo a opinião pública da responsabilidade da internet na queda das vendas de CDs, a indústria fonográfica utiliza a via legal para obter a confiança dos investidores e a garantia de que suas empresas são um bom negócio.

Estão dando um tiro no pé.

(Com informações da Carta Capital nº 286)


Haymone Neto @ 8:29 PM

layout name: express yourself -- layout by: nyokiglitter

This page is powered by Blogger. Isn't yours?