sete dias
sete dias como a seven days diet. como a vela de sete dias.

Sete Dias antes
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cada dia uma coisa
sexta-feira, abril 30, 2004

A vida é como uma caixa de chocolates (ou Being Bia Bonduki)

Semana passada, ao ler a coluna de Bia, uma pequena dose de inveja tomou conta de mim. "Pô, queria contar histórias também". Conversei longamente com o editor, negociamos e consegui autorização pra contar causos pelo menos uma vez. Com uma condição: que os casos não fugissem totalmente do tema cinema. Não fugirão. As histórias que eu vou contar se passam numa videolocadora. Especificamente, na locadora onde eu trabalho.

Eu sou uma pessoa estressada. Então quando chegam aqueles clientes eu-sou-um-empresário-bem-sucedido-e-ocupado-portanto-me-vê-rápido-um-lançamento-policial me dá logo uma agonia. O que não acontece quando liga Seu F., um imigrante italiano de setenta e poucos anos. Seu F. aluga, no mínimo, um filme por dia. E me aluga durante vinte minutos no telefone. Mas podia alugar por bem mais que isso: ele sabe tudo sobre cada filme, quem fez o quê, que filme é remake daquele de 1954, que cineasta cult era o diretor de fotografia daquele filme trash, enfim, Seu F. é uma verdadeira enciclopédia com sotaque italiano. E uma enciclopédia crítica, porque ele tem umas opiniões bem, digamos, incomuns para, digamos, alguém com sua formação cultural. Para a decepção de vocês, Seu F só gosta de "filmes de verdade. Não essa palhaçada de filme italiano, filme brasileiro...". Seu F. só aluga comédias e aventuras, mas nem por isso usa o clichê "de drama já basta a vida". Seu F. não acata a sugestão alheia e quase me engole vivo quando eu falei "por que o senhor não leva O Filho da Noiva?". "Eu acabo de falar que não suporto filme brasileiro nem italiano, e você me vem com um ARGENTINO?". Seu F., eu sou seu fã.

E isso nos leva à Dona X. Dona X. caminha no parque da Jaqueira todo dia, com uma viseira chiquérrima (a viseira dela poderia ser tema da coluna de Daniela Arrais, de tão chique que é). Certo dia, voltando pra casa (é, eu acho que "contar causo" tem que ser meio Chapeuzinho Vermelho, com essas fórmulas adoráveis do tipo "certo dia", "quando, de repente"... enfim, vamos voltar ao que interessa), Dona X. entra na locadora, depois de muito tempo. Sua filha havia se associado recentemente, ela não conhecia a locadora ainda; pergunta se eu posso ajudá-la a achar a sessão de clássicos. Como ela bem notou, a locadora é meio desprovida de filmes antigos. Mas nem por isso a nossa modesta lojinha deixou de fazer os olhos de Dona X. brilharem. Claro que, para isso, contamos com a ajuda elegante de Humphrey Bogart, mais precisamente com os relançamentos de A Trágica Farsa, Confissão, No Silêncio da Noite e Sirocco em DVD. Dona X. falou com saudade daqueles tempos que não voltam mais e de como já não se faz mais cinema como antigamente. Discordei sutilmente e quase que implorei pra ela levar Fale com Ela pra casa. Dona X., bem mais maleável que o Senhor F., aceitou. Antes que eu me esqueça de contar, Dona X. é viúva. O Senhor F. também. Se o nome dele fosse Y., até que poderiam formar uma bela equação.

Erm... Tenho a impressão de que o meu humor infame foi longe demais. Então deixa eu pular direto para o final melancólico: Dona X. não entregou o filme do dia seguinte, como combinado. Nem depois, nem depois. Aparece lá após cinco dias e acha um absurdo que lhe cobrem a multa. “Não pago. Não pra um filme imoral como esse” – o que me fez lembrar do senhor M., que está Com a Verga na Mão há nove dias e certamente adoraria essa história de não pagar multa por filmes imorais. Mas isso é assunto para outra coluna do tipo que, acabo de ser informado pelo editor, não vai existir. Dia de causo é quinta-feira. Contadora de história é Bia Bonduki. E Forrest Gump.

Fábio Leal @ 5:04 AM

quinta-feira, abril 29, 2004

Grandes complicações trazem grandes responsabilidades - Parte I


Nos anos 80, a editora DC Comics resolveu abrir um plebiscito entre seus leitores. Muitos deles estavam insatisfeitos com o personagem Jason Todd, que substituiu Dick Grayson como o menino prodígio Robin (Dick havia aposentado o uniforme e, até hoje, atua com o codinome Asa Noturna). Portanto, a eleição era simples: os leitores votariam, sim ou não, pela morte de Jason. A maioria votou pelo sim, e Jason bateu as botas depois de uma cilada armada pelo Coringa.

O nariz-de-cera acima foi por dois motivos: apenas para abrir o texto com um dos milhares de causos do universo dos quadrinhos e também usá-lo de exemplo. Quando fui convidado pro Sete Dias, relutei um pouco em aceitar por alguns motivos, mas o principal deles era o pepino que seria abordar a temática quadrinhos para um público novo e diferente. Essa bronca será o mote desta primeira coluna, mais embaixo. Onde eu estava? Ah, sim, o exemplo. Caso vocês, leitores e editores do blog, percebam que este escriba não consiga dar conta do recado - isto é, não consiga instigar as discussões, nem trazer o mínimo de informação e análise necessária -, fiquem à vontade para acionar a guilhotina e trazer outro colunista mais superpoderoso e carismático do que eu.


*****

Quando a gente é criança, tudo na vida é mais fácil. O pai ou o tio te compra uma revista da Mônica, e pronto. Isso é quadrinhos: leitura simples, com desenhos bonitinhos, comprada na banca com o dinheiro do lanche. E ainda na infância, talvez você já tenha a convicção disso. Depois que leu, joga fora e compra outro gibi. Quando for adulto, nem vai gostar mais daquilo.

Hoje em dia, até os mais leigos devem ter se tocado que não é bem assim. Quadrinho não é só pra criança. Nem todo quadrinho é fácil de ler e acompanhar. Nem todo quadrinho é barato - aliás, está cada vez mais caro. Quadrinho não vende só em banca. Quadrinho não é só Mônica, Disney, super-heróis e mangá. Pouco a pouco, os tabus e máscaras vão se desfazendo. Mas e aí? O que é quadrinho, afinal?

Quadrinho é uma forma de expressão, arte e entretenimento. Como outra qualquer. Tem cara que é cinéfilo, tem outro que é viciado em ler livros, e tem gente que lê quadrinhos. Se o sujeito é bitolado em apenas um gênero de HQ ou é um puta nerd, são outros quinhentos - e renderão outras colunas. A questão é que, apesar da consciência comum sobre o valor dos quadrinhos crescer cada vez mais, creio que ainda exista uma barreira dissimulada em muita gente. Em suma, muitos conhecem na teoria, mas falta haver mais contato do povão com os quadrinhos.

Vejam vocês o meu problema. Se eu parar um sujeito na rua e começar a falar de cinema, provavelmente ele saberia dizer quais são seus filmes preferidos. Ou seus atores e atrizes, e quem sabe, citar o nome de um diretor, nem que seja Spielberg. Se eu mudar o foco da conversa e falar de música, ele podia dizer que curte um Roberto Carlos, um Beatles ou a banda de axé-brega do momento. "Mas e quadrinhos, do que você gosta?", perguntaria eu a certa altura. "Err... eu lia a Mônica quando era pequeno...", ou se muito, "Gosto daquela tira do Angeli, que sai no jornal". Não iria muito além disso; a menos que eu desse a sorte de encontrar um que realmente conhecesse mais a fundo. A chance existe, mas é minúscula.

Resumindo: no gosto geral, quadrinhos ainda é uma arte muito 'cult', por culpa de uma indústria cultural que privilegiou artes que fornecem retorno financeiro mais imediato, como cinema e música. Claro que a arte seqüencial não é o único caso: quantos por aí acompanham as novidades em dança? Ou em teatro? Nessa indústria, muitos não ficam sabendo das novas revistas/peças porque a verba de divulgação destas é muito pouca ou inexistente. E quem ouviu falar e tem vontade de conferir, às vezes desiste porque o produto é caro.

A coluna tá ficando grande e vou interrompendo por aqui. Mas devo retomar e continuar nas próximas quinzenas (vou dividir a quinta-feira com Bia, para quem ainda não sabe). Só depois de passar por isso é que devo amadurecer a coluna, deixando cada edição mais fechadinha em si mesma. Tenham em mente que o esforço inicial é para introduzi-los, da forma mais didática possível, neste rico e hermético universo de balões e onomatopéias. Desejem-me sorte.

MPadrão @ 7:33 AM

terça-feira, abril 27, 2004

Eu quero muito gostar de Bukowski: diga-me como
Por Jorge Wakabara

Eu não gosto de Bukowski. Acho um pé no saco. Sei que isso não é opinião que se apresente, eu seria o primeiro a levantar a voz, bater na mesa, "porra, não tem argumento então por que tá falando?", mas desculpa. Basicamente é isso: li e achei um pé no saco. O velho escreve bem, eu reconheço, o estilo narrativo é leve, fácil, com uma linguagem igualmente fácil, tem umas partes bem engraçadas...
Isso faz um livro?

Bom, tem coisas com essas mesmas características estilísticas que eu gosto bastante. Por exemplo: eu gosto de Fernanda Young (se você não sabia, leia coluna da semana retrasada). Simpatizo com Nick Hornby. Sou consumidor voraz de biografias de artistas de cinema. Pôxa. Então por quê?
Tentemos verbalizar os tão necessários argumentos.

Eu acho um saco porque ele é chato. Ele não é safado: ele é chato. Ele só trepa e bebe. Trepar e beber são duas das coisas mais divertidas que existem, e existem milhares de outras coisas divertidas. Só que ele fode alguém, fica bêbado, parágrafo seguinte ele já tá de olho em outra mulher, bebe mais um pouco, aí ele fode de novo... Praticamente uma máquina de sexo movida a álcool.

Seguinte: todos vocês, leitores informados, cultos, sabem muito bem que a indústria cultural usa tudo ao gosto do homem médio, deixa tudo homogêneo, fácil de engolir. Existe até fórmula: tem o conflitinho ali, uma reviravolta acolá, o herói (ou anti-herói), os problemas, a resolução dos problemas, muito simples para ninguém precisar pensar. Pronto: depois de um dia inteiro de trabalho, você vai poder sentar na sua poltrona preferida e curtir uma historinha, vivenciar algo fora da sua vidinha cheia de preocupações - em suma, desligar-se do mundo. A intenção aqui, obviamente, não é criticar o lazer que não desperta força criativa / visão crítica / reflexão. OK: é na base da passividade que funciona? Tudo bem. Mas então me traga uma história, me traga elementos que vão me deixar envolvido, me traga reviravoltas a cada página. Bukowski não faz isso. E não me desperta nenhuma reflexão também. Ele só trepa e bebe.

Mas aí eu penso: tanta gente gosta. Por que raios eu não suporto? Ou o que leva as pessoas a gostarem desses livros sem história, sem questionamentos, sem... conteúdo? E eu queria gostar, sabe? Pra me enturmar mesmo: não é bacana quando alguém gosta dos mesmos livros que você, rola uma conversa sobre o assunto, uma troca...
Fã de Bukowski, você mesmo, que está espumando de raiva agora. Conta pra mim. Por que você gosta desse cara?

P.s.: A poesia de Bukowski difere da prosa, portanto não é ela que está em xeque. Em outra coluna a gente conversa sobre isso.

Fábio Leal @ 8:43 AM

sexta-feira, abril 23, 2004

O dia em que Carla Perez encontrou uma camisinha assassina

Eu gosto de coisas trash. Adorava ouvir La Bomba, dos Braga Boys (e, graças ao Napster, a versão original também), via quase todos os capítulos de Topázio, no SBT e, no mesmo canal, emendava com Cocktail, aquele programa “erótico” apresentado por Miele. Como não poderia deixar de ser, os filmes trash formam um gênero (gênero?) que me agrada muito. Hoje vou falar de dois exemplares desse cinema; um assumido, o outro não.

Assumido e precavido

O primeiro “trash” de hoje é um filme alemão chamado A Camisinha Assassina. Obviamente, algo com esse nome só poderia ser trash. Mas a bizarrice do filme não reside só no fato de ele ser sobre, ahm, uma camisinha assassina e de ter como slogan “agora é a camisinha que come você”. Como todo bom filme de serial killer, ele se passa em Nova York. “Ué, mas você não falou que era alemão?”. É alemão. E, sim, se passa em Nova York, onde todos, claro, falam a língua de Hitler. E não pára por aí: o detetive designado para desvendar o caso é um imigrante italiano gay chamado Luigi Mackeroni. Um imigrante italiano gay chamado Luigi Mackeroni e que tem uma peculiaridade: é super-ultra-bem-dotado, ou seja, torna-se o alvo preferencial da camisinha assassina. Apesar de aparentar ser um machão, Luigi é extremamente sensível. Num dos diálogos mais inspirados do filme, Mackeroni lamenta: “ele não está apaixonado por mim, só está encantado com os meus 32 centímetros”.
Infelizmente, superada a surpresa inicial com o plot e os (d)efeitos especiais, A Camisinha Assassina perde um pouco de sua graça. As situações acabam se repetindo e a vontade de mostrar coisas cada vez mais bizarras acaba virando uma tentativa um tanto frustrada de chocar o público.

A FRASE: “Ninguém tira um testítulo de um Mackeroni e sai impune”.

Enrustido com dendê

A segunda dica trash da coluna é uma pequena pérola do cinema nacional: Cinderela Baiana, estrelado pela então rebolante Carla Perez (hoje apenas mãe de Camilly Victória e Victor Alexandre). Este é um filme que, por incrível que pareça, merece ser visto. Até porque é difícil acreditar que algo assim seja produzido. Vejamos o enredo: “Carlinha” mora com os pais no interior da Bahia. Enquanto sua mãe tuberculosa “trabalha” cavando buracos na estrada (!!!), Carlinha ensaia alguns passos de dança ao lado, sem nem se preocupar com a tosse nem com o duro ofício da mãe. Quando a menina abre a boca, é pra dizer que está com fome. Pouco tempo depois, a mãe de Carlinha morre e ela e o pai mudam-se para Salvador, onde Carlinha, claro, torna-se Carla e, um pouco mais tarde, Carla Perez. A sensualidade e maestria da dança de Carla fazem com que as vendas de acarajé aumentem e, posteriormente, a falsa loira vira um fenômeno nacional, participando dos programas de Luciano Huck e Silvia Poppovic.
Cinderela Baiana, em comparação com A Camisinha Assassina, sai levando a melhor, porque tem um, digamos, “frescor trash” (hahaha) que o alemão não consegue ter. O humor do filme (quando consegue ser engraçado) é completamente involuntário. Todos parecem acreditar realmente no que estão fazendo – incluindo aí o agora cult Lázaro Ramos, que interpreta seu papel de “bobalhão-melhor-amigo-da-protagonista” com maestria.
Vejam este filme e DE FORMA ALGUMA desliguem antes do fim. O final é algo que ficará nos seus corações e mentes para sempre.

A FRASE: “Mas essa baianinha parece uma Cinderela! Será que ela é o anjo que veio para iluminar a minha vida?” (proferida por uma vendedora de acarajé)

Serviço:

A Camisinha Assassina (Kondom des Grauens, Alemanha, 1996)
Dirigido por Martin Walz
Com Udo Samel, Peter Lohmeyer, Marc Richter
Cópias em VHS pela Reserva Especial

Cinderela Baiana (Brasil, 1998)
Dirigido por Conrado Sanchez
Com Carla Perez, Perry Salles, Lázaro Ramos, Alexandre Pires
Cópias em VHS pela Playarte

Fábio Leal @ 4:27 PM

quinta-feira, abril 22, 2004

Muito prazer, sou Bia, a contadora de “causos”.
Se eu não tivesse que trabalhar para o sistema (haha!), teria prazer em possuir minha cabaninha em algum parque, e nela contaria todas as minhas histórias para pessoas de todas as idades. São várias, e de tanto falar da vida alheia conhecida ou não, um dia um amigo me incentivou a coletar as melhores e publicar num livro. O projeto é tema para outro dia.

Prá começar, não sabia bem como, se contava algum caso de cara, ou se exemplificava vários. Aí olhei a chuva e, falando com minha mãe, lembrei de uma historinha que ela contava para me manter longe da janela de casa nos dias de dilúvio. Era assim:

O Ditinho Passarinho era um pardalzinho-criança, muito desobediente. Um dia, a mamãe-pardal foi ao Pequeno Mundo (supermercado da minha cidade) e alertou o Ditinho para ficar longe do beiral do telhado, ou ele cairia e não saberia voltar. Claro, ele desobedeceu, caiu e ficou no chão, sem conseguir voar. Aí ele fazia “piupiiiiiiiiu, piupiiiiiiu...” – nessa hora minha mãe franzia as sobrancelhas para cima e fazia biquinho, e eu imitava – e ninguém ouvia. Até que começou a chover e ele ficou desesperado. “Piiiiiupiiiuuu....” e nada. Ditinho estava como um pinto molhado (hein? hein?), quando uma boa alma apareceu. Era Maria Etelvina, nossa cachorra vira-lata com dotes de Santa Paulina, se aproximando. O pardalzinho tremeu, mas Teté, a boa, só queria aquecê-lo com seu bafo, já que passarinhos não a apeteciam. A mãe de Ditinho chegou e viu o filho sob os cuidados da cadela, deu-lhe uma bela bronca e o passarinho nunca mais chegou perto do beiral. Fim da história.

Agora, imagine aqui a pequena interlocutora que, onde ia, contava a tal história reproduzindo os piupiiiius fielmente, inclusive na parte das sobrancelhas e do biquinho. Sério. Eu adorava contar essa história, fosse prá quem fosse, em todas as ocasiões. A manicure da minha mãe acabou me apelidando de Piu-Piu pelo resto da minha vida, principalmente na adolescência, quando ela pedia prá que eu fizesse as caras e bocas pro salão inteiro. Era vexaminoso para uma donzelinha de seus catorze anos, mas era o preço que eu pagava por ser, assim, contadora de histórias.
E para vocês não ficarem na curiosidade, prometo imitar o passarinho para o próximo que me vir ao vivo.

Na próxima semana, eu conto do dia que o avô da minha amiga fez os filhos sossegarem a algazarra com apenas uma curta frase.


Bia Bonduki @ 9:57 AM

terça-feira, abril 20, 2004

Retiro o que disse na semana passada e mais algumas bobagens
Por Jorge Wakabara

Confesso que essa semana foi uma loucura, não deu tempo de fazer uma coluna realmente decente focada num livro ou autor, PORTANTO dessa vez vamos ter pedacinhos de coluna. Tudo bem, porque eu também gosto desse formato, é fácil de ler, é gostoso, é praticamente um livro de auto-ajuda (dã, piada boba).

***

Fui na Bienal e retiro tudo o que disse na semana passada. Ninguém merece a Bienal, gente. Primeiro: excursões de escola. As crianças gritam. Tem monitor em estande de microfone, praticamente um karaokê. Tem livro porcaria por três reais. Tem livro mais ou menos por dez. Mas na maioria das editoras, meu amigo, o que rola é um descontinho aqui e acolá, e só lançamento nas prateleiras.
Fora a canseira, a bagunça, a decepção de quem queria encontrar o inesperado, a falta de paciência de checar se tem alguma palestra legal, etc etc, se você tem bastante dinheiro sobrando, me dá um pouco e vai com o resto com o intuito simples de GASTAR OS TUBOS. Deve ser legal: eu não fiz porque não tô podendo.
Pra quem é pobrinho... aguarde: circuitinho de sebos de Pinheiros em breve.
Obviamente, isso significa coisas mais baratas e interessantes.

***

Breve nota sobre o último livro lido: Dez dias que abalaram o mundo, do John Reed, e é do caralho. Uma extensa e detalhada reportagem sobre a Revolução de Outubro de 1917, com uma linguagem leve e dinâmica. O livro deve ser lido com uma certa cautela: Reed era defensor do governo socialista e os bolcheviques são retratados como heróis de uma aventura magnífica - um pouco de senso crítico não faz mal a ninguém nesses momentos, especialmente se o autor não se preocupou em ter um distanciamento crítico. Ao mesmo tempo, a história empolga por causa desse tom "épico" que o autor assume, e também não deixa de trazer transcrições de documentos e acontecimentos históricos. Texto muito bom para quem se interessa por jornalismo e/ou Revolução Russa.

Fábio Leal @ 2:55 PM

domingo, abril 18, 2004

Síndrome de Poliana II – Responsabilidade Social

A Globo é uma empresa fantástica, concorda? Além de manter um canal educativo (o Futura), ela ainda é uma empresa Amiga da Escola, e incentivadora da cultura nacional, tendo sido o berço da teledramaturgia brasileira. Ah, e é quem promove a arrecadação de milhões de reais todo ano, com o projeto Criança Esperança. A Globo só não é melhor que aquela concessionária de veículos que tira uma criança da rua cada vez que um veículo é vendido.

As empresas há muito perceberam que, além de “dar um grau” na imagem da companhia, a responsabilidade social é uma forma de agregar valor às marcas. A Globo, por exemplo, durante muito tempo foi vista com maus olhos, especialmente durante a primeira metade dos anos 80, quando o país bradava por eleições diretas e a emissora, devido a seus conchavos com a ditadura, se escusava de dar qualquer destaque ao movimento nos seus noticiários. Mas a nossa memória é curta, e hoje temos a Globo como uma empresa que nos dá orgulho de ser brasileiro, que exporta um produto cultural 100% nacional para os lares dos mais diversos países e ajuda a matar a fome das criancinhas carentes.

Estima-se que, em certos programas de responsabilidade social empresarial, 30 reais são gastos em marketing para cada 1 investido na causa social relacionada (revista Carta Capital, edição especial, dezembro de 2003). Há casos em que a adoção de um programa de responsabilidade social por uma empresa resulta em benefícios fiscais para ela. Ou seja, o estado deixa de arrecadar (e, portanto, de investir) para que a empresa financie um programa social qualquer, o que é um contra-senso. A responsabilidade social se torna, assim, um grande negócio.

As organizações não-governamentais são as grandes beneficiadas por essa onda de responsabilidade social. Mas o terceiro setor, em casos como o acima citado, ao invés de usar recursos privados para fins públicos, está indiretamente usando recursos públicos (isenção de impostos) para fins privados (valorização da marca). Enquanto isso, há estimativas de que existam salários da ordem de 20 mil reais para presidentes de certas ONGs.

Não quero, contudo, desmerecer todo e qualquer tipo de programa de responsabilidade social empresarial. Sabe-se que há projetos consistentes, e com resultados comprovados. Se a responsabilidade social é ruim, muito pior é que ela não exista. Acordos internacionais de responsabilidade social vêm fortalecendo, por exemplo, os sindicatos de metalúrgicos do ABCD paulista, obrigando empresas e fornecedores terceirizados a cumprir preceitos de responsabilidade social que melhoram as condições de trabalho.

O que ressaltamos é que, por mais efetivo que seja um programa social, o seu objetivo é, no máximo, ajudar a reduzir as desigualdades sociais. Não se muda, e, principalmente, não se quer mudar o sistema através de programas de responsabilidade social. O explorado será menos explorado, o mundo será menos ruim, mas a lógica permanece inalterada. Será que é só isso o que a gente quer?



Haymone Neto @ 11:05 PM



parece que é só pra contrariar. eu já mal escrevo neste blog e quando escrevo é fora do meu dia. mas não é pra contrariar não.

estou postando hoje para avisar aos possíveis leitores que estou me desligando do setedias. desligamento amistoso, pensado e com vontade. o blog tem a proposta de publicar cada dia da semana um novo texto e eu não estava colaborando com isso.

mas a idéia de contar as tais histórias tão prometidas não parou aqui. estarei viajando por esses dias, mas quando voltar, prometo colocar aqui um endereço novo para essas conversas. e com fotos, e outras gentes. a viagem deve me trazer encontros interessantes e pretendo aproveitá-los bem. decerto, não prometo regularidade nos escritos, mas prometo as tais histórias. quase lendas já.

no mais, meu desligamento do setedias será apenas do compromisso de ter que postar toda santa quinta-feira. combinei com fábio que vez ou outra posso mandar uma colunazinha extra. sendo assim, desculpem-me os possíveis leitores. ou os que ainda iriam chegar.

um abraço a todos.

simone jubert @ 2:38 PM

sexta-feira, abril 16, 2004

E hoje é aniversário da colunista mais chique do Sete Dias. Parabéns, Daniela Arrais!

Fábio Leal @ 5:33 PM



O assalto à coleção de DVDs alheia

No ano passado eu apresentei a uma amiga minha uma maravilha chamada coleção de DVDs. Claro que essa “maravilha” só pode ser curtida por gente que tem dinheiro. Eu, como não tenho, arranjei essa maneira de curtir por tabela: mandava ela comprar e pegava emprestado ad eternum.

O problema é que eu tenho um bloqueio com filmes emprestados. Passo meses com eles guardados e nunca os vejo. Foi isso o que aconteceu com O Assalto ao Trem Pagador, filme que estava há pelo menos quatro meses em cima da mesa da sala e que só fui ver há duas semanas.

Não tenho muita atração por datas redondas, mas não deixa de ser curioso notar que O Assalto ao Trem Pagador foi lançado em 1962, exatos quarenta anos antes de Cidade de Deus. Cidade, antes do cansativo debate envolvendo o rótulo "cosmética da fome", foi festejado por dar "voz à favela", por empregar atores da própria comunidade etc. e tal. Quem fez esse tipo de comentário sobre o filme de Fernando Meirelles certamente não deve ter visto Assalto. Se em Cidade de Deus nós temos um VILÃO, Zé Pequeno, em Assalto há um bando de personagens tridimensionais, liderados por Tião Medonho, que de forma alguma pode ser considerado um "vilão" ou um "mocinho". Tião e seus comparsas são gente, coisa que falta no candidato ao Oscar 2004.

O filme faz uma adaptação livre de um fato real acontecido em 1960, no Rio de Janeiro: o assalto a um trem que levava 27 milhões de cruzeiros, destinados ao pagamento de mais de mil ferroviários. Cinco assaltantes liderados por Tião Medonho (único personagem real do filme), armados de metralhadora, roubaram o dinheiro e dividiram entre si. A partir daí, o filme ficcionaliza os fatos – mas nem por isso deixa de ter peso. Os "bandidos" não podem gastar mais de 10% do dinheiro tomado, afinal, "favelado ganhando dinheiro rápido é coisa suspeita". E esse é o ponto alto de Assalto ao Trem Pagador: explorar a esdrúxula situação de pessoas que têm dinheiro suficiente para mudar suas vidas e não podem gastá-lo. Roberto Farias, ao mesmo tempo em que faz um thriller investigativo, investe tempo em analisar a vida na favela, as relações de ética, as relações humanas mesmo. Poucas vezes vi um desfecho tão impactante como o desse filme.

O DVD

A Funarte, através do DeCine, restaurou o filme – diretamente do master original – de maneira competentíssima. A imagem é extremamente limpa, a parte sonora foge completamente do clichê "som de filme brasileiro é uma merda". Como se não bastasse, os extras do filme têm um grande valor histórico. Diferente dos depoimentos do tipo "foi maravilhoso participar", "fulano é muito generoso", aqui temos grande parte dos envolvidos relembrando como foi fazer o filme quarenta anos antes – e as lembranças nem sempre são positivas.

Roberto Farias fala com um certo desdém da participação de Luiz Carlos Barreto no projeto e diz que este viajou para Paris quando o roteiro tinha que ser feito. Já Barretão fala com muito orgulho de ter "escrito" o roteiro e, obviamente, não menciona sua viagem à França. Ruth de Souza, ao falar sobre sua personagem, não esconde o desapontamento por ter sido escolhida para fazer o papel de amante e não de esposa. "Acho até que fiz uma amante com cara de esposa", comenta num certo momento.

Tomara que a Funarte continue realizando resgates como esse, porque, de outra forma, o nosso capenga jornalismo cultural vai continuar louvando filmes como Cidade de Deus com gritos de "inovador", quando a inovação já tinha sido feita décadas antes.

Fábio Leal @ 5:32 PM

quinta-feira, abril 15, 2004

bla bla bla.

só pra marcar o espaço da quinta-feira. nem que eu edite na sexta ou no sábado.

e essa senhora loura aí embaixo é joelmir beting de peruca.

simone jubert @ 11:00 PM

terça-feira, abril 13, 2004

Contagem regressiva para a Bienal

Por Jorge Wakabara


A 18a. Bienal Internacional do Livro começa essa semana, dia 15, e vai até 25 de abril, no Centro de Exposições Imigrantes. Ela comemora os 450 anos de São Paulo (como todos os outros eventos realizados na cidade atualmente) e traz vários convidados especiais.

No Café Paulicéia, por exemplo, espaço destinado aos 450 anos, estão programados debates sobre música (com Zuza Homem de Mello, Solano Robeiro, Tom Zé, Julio Medaglia), cinema (Ismail Xavier, Ugo Giorgetti, Carlos Reichenbach) e prosa e poesia (Mario Chamie, Fernando Bonassi, Nelson de Oliveira, Glauco Mattoso, entre outros).

Quem se interessa em “negócios” - o que pode soar meio estranho na Bienal do Livro mas é o que mais existe - pode conferir a agenda da Escola do Livro, com palestras do gênero "Encontre uma editora para seu livro", "Vendas no mercado editorial" ou até mesmo "Como abrir uma livraria". O problema é o preço salgado: varia de R$ 30,00 a 50,00.

Os acadêmicos ganham de graça – ah, bom! - 30 palestras voltadas especialmente para eles, no Espaço Universitário. O objetivo, segundo a organização, é "dialogar e debater os rumos e oportunidades para os jovens que pretendem ingressar no mercado de trabalho", com a presença de diversos professores universitários. Parece interessante.

Os escritores convidados

Depois de tantos "extras", faltou falar das grandes estrelas: os escritores que comparecem e prestigiam o evento. Selecionei alguns, porque são muitos, acredite. Seguem abaixo:

Lya Luft, Nélida Piñon, Silvano Santiago, Ziraldo, Leonardo Boff, Heloisa Prieto, Fernanda Young, Marcelo Rubens Paiva, Cristóvam Buarque, Ignácio de Loyola Brandão, Adélia Prado, Nick McDonell (estreando com o livro Doze), Carlos Fino (jornalista, autor do novo "Guerra ao vivo", no qual conta sua experiência em cobertura de guerras), Michel Maffesoli (sociólogo e professor de Sorbonne, que analisa em sua nova obra "A parte do diabo" o esvaziamento político, a violência e os conflitos da pós-modernidade usando raves e shows de rock - ???), Filipa Melo ("Este é o meu corpo", seu romance de estréia, traz uma mistura bizarra de mistério e autópsia - parece que é uma coisa BEM DESCRITIVA... ui), Gavino Ledda (autor de "Pai patrão"), Armando Vega-Gil (pop, escritor, poeta, antropólogo - não necessariamente nessa ordem) etc.

Como o leitor pode reparar, o evento é MEGA mesmo, do jeito que poucas vezes se vê, mesmo em uma cidade grande. Dá gosto ver uma Bienal assim, super produzida? Dá, claro, o que vier é lucro. O mercado editorial cresce, por mais que a situação não pareça favorável, com a expansão a olhos vistos de títulos nas livarias. Ainda falta mais discussão a respeito dos rumos da literatura, do que existe disponível hoje nas prateleiras das livrarias, e se a quantidade de gente disposta a investir é equivalente à qualidade nos títulos.

Quem for visitar a Bienal, não espere um paraíso: muito livro com fotos fofinhas de animais e frases de auto-ajuda ocupam as prateleiras. Mas sempre têm as promoções, as palestras interessantes, os lançamentos bons; ou seja: pesando os prós e os contras, vale a pena.

Serviço:

18a. Bienal Internacional do Livro de São Paulo

15 a 25 de abril - 10h às 22h

Centro de Exposições Imigrantes - acesso pela Rodovia dos Imigrantes ou Av. Miguel Stéfano, próximo à Avenida dos Bandeirantes e à Avenida Ricardo Jafet

ingresso: R$ 8,00 (estudante: R$ 4,00)

Ônibus gratuitos da estação de metrô Jabaquara a partir das 8h30

Fábio Leal @ 11:08 AM

domingo, abril 11, 2004

Consumer Activism e a síndrome de Poliana

Eu lembro de quando começou a guerra do Iraque. Vários amigos meus pararam de beber Coca-Cola como forma de protesto. Em alguns países, dentre eles a Alemanha, dizem até que o boicote surtiu efeito. No Brasil, a Coca-Cola até publicou nota oficial, afirmando que gerava não-sei-quantos empregos diretos com carteira assinada no país e coisas desse tipo. Não sei, sinceramente, até onde são eficazes os boicotes e o consumer activism em geral.

No último Fórum Social Mundial, em Mumbai, Índia, a escritora nativa Arundhati Roy propôs que se identificassem as duas empresas transnacionais mais envolvidas com a guerra do Iraque para que fossem boicotadas numa grande mobilização internacional. A concentração em apenas duas empresas seria uma forma de provocar “danos reais” a elas, como a fuga dos investidores e a queda do faturamento (revista Reportagem, nº53). As entidades participantes do Fórum não chegaram num consenso com relação a quais empresas boicotar.

O site No Logo, da jornalista canadense Naomi Klein, no entanto, destaca as várias limitações políticas do consumer activism. Diz que “nosso sistema econômico torna quase impossível consumir ‘eticamente’, já que tudo que é produzido nele se faz com a exploração do trabalho humano e do meio ambiente”. O principal valor desse sistema é a maximização do lucro, sendo “outros valores, como dignidade humana e solidariedade, ou sustentabilidade do meio ambiente [...] relevados quando limitam potencialmente o lucro”.

Portanto, consumir “eticamente” seria apenas uma tentativa de tornar esse sistema “menos mau”, sem se preocupar com sua continuidade. Não haverá mudança social real, diz o texto, baseada apenas na nossa capacidade de consumo; é necessário cumprir nosso papel como agentes humanos, “lutando em várias frentes pela justiça e dignidade das pessoas”.

E daí?

Eu me penso nessas questões quando vou ao supermercado, por exemplo. Vejo o leite da Parmalat a um preço mais em conta que o da marca concorrente. Lembro de toda a roubalheira recentemente descoberta envolvendo a empresa italiana e suas filiais no mundo todo, inclusive no Brasil - nesse momento, resolvo boicotar a empresa. Mas sei que, agora, a empresa já entrou em concordata; as irregularidades foram desvendadas; os responsáveis, alguns, punidos. Os maiores prejudicados com o meu possível boicote, neste momento, são os pequenos e médios produtores que fornecem o leite à empresa. Estes não têm nada a ver com a pilantragem dos fraudadores e sonegadores engravatados. Por outro lado, penso no que a escritora indiana defendeu, e não consigo deixar de imaginar o quão catastrófico (e eficaz) seria um boicote organizado internacionalmente, dedicado a apenas duas empresas transnacionais.

A grande questão, portanto, talvez seja não encarar o consumer activism e os boicotes como um objetivo, um fim em si mesmo. Eles podem ser um meio eficaz, em curto prazo, para a trajetória de mudança da sociedade, a fim de torna-la mais justa e digna. Mas apenas isso não me parece ser suficiente, já que não modifica a lógica do sistema.

De qualquer forma, acabei comprando o leite do concorrente.


Haymone Neto @ 11:55 PM

sexta-feira, abril 09, 2004

La petite casserole du Festival de Cannes

No final do mês serão anunciados os filmes indicados para a Mostra Competitiva do Festival de Cannes. Se antigamente esta era uma lista muito aguardada, por conter filmes incomuns, de uns tempos pra cá a direção do Festival tem optado por algo que pode ser chamado de "o mainstream do alternativo". Um bom exemplo disso é a edição passada do Festival: dos vinte diretores que competiam, dezesseis já haviam mostrado outras produções suas em edições anteriores do Festival. Talvez por isso o júri presidido pelo cineasta Patrice Chéreau tenha optado por dar a Palma de Ouro a Elefante, de Gus van Sant, até então um "virgem de Cannes" (mas que agora deverá ter seus filmes exibidos no Festival). Com essa aparente preguiça em selecionar os participantes, escolhendo o fácil caminho de levar para o Festival seus velhos conhecidos, Cannes pode perder o caráter avant-garde que tanto preza e virar apenas uma vitrine para "o novo Eastwood", "o novo Kiarostami" ou "o novo Greenaway".

A 57ª edição do Festival não parece ser a que vai mudar esse rumo. Periódicos de cinema como o Hollywood Reporter e Variety já dão como certos na Mostra Competitiva deste ano os filmes Life is a Miracle, de Emir Kusturica (palma de ouro por Underground - Mentiras de Guerra, Vida Cigana e Quando Papai Saiu em Viagem de Negócios), 2046, de Wong Kar-Wai (Melhor Diretor por Amores Expressos) e Land of Plenty, de Wim Wenders (Palma por Paris, Texas, Melhor Diretor por Asas do Desejo, Grande Prêmio do Júri por Tão Longe, Tão Perto), além dos novos de Godard, Spike Lee, Mike Leigh, Zhang Yimou, todos premiados em Cannes. E, para alegria de minha amiga Tatiana, o supracitado Abbas Kiarostami deverá estar lá outra vez, agora com Dedicated to Ozu. É bom lembrar que essas são só especulações. O único filme com participação certa, até agora, é Diários da Motocicleta, primeiro filme “estrangeiro” de Walter Salles, sobre a vida de Che Guevara antes do “hay que endurecerse”. Portanto, algumas surpresas poderão aparecer entre os selecionados.

O Festival de Cannes deste ano vai acontecer entre os dias 12 e 23 de maio, com júri presidido por Quentin Tarantino.

* * *

Por falar em Tarantino, numa coletiva pra divulgar o Volume 2 de Kill Bill (o Volume 1 chega aqui no próximo dia 23) ele declarou que vem conversando com Pierce Brosnan sobre dirigir o próximo filme da série 007 - o último com Brosnan no papel de James Bond. O problema, segundo Tarantino, é convencer os produtores a saírem do esquema filme-de-ação-com-orçamento-milionário. "Mas eu não vejo o que eles têm a perder. Pierce Brosnan só vai fazer mais um filme com eles - e por que não fazer desta vez do meu jeito, um pouco diferente? Eu não vou fazer nada que vá arruinar a série". Tarantino acha que suas chances são mínimas, "mas não seria ótimo fazer um filme que, em vez de custar 115 milhões de dólares, custasse apenas 40 milhões?". Se Tarantino conseguir fazer da enfadonha série 007 algo divertido como Kill Bill, seria realmente ótimo.

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Pra quem é chegado numas cinebiografias de gosto duvidoso, vem aí Piece of My Heart, obviamente sobre a vida de Janis Joplin. Até aí, nada demais, se não fossem as envolvidas no projeto: a diretora é Penelope Spheeris, de Quanto Mais Idiota Melhor. E a intérprete de Joplin será ninguém menos que a popstar Pink, fazendo sua estréia no cinema. Antes que alguém ainda tenha esperanças do contrário: SIM, Pink cantará todas as músicas com sua própria voz. Aliás, a trilha já está sendo produzida pela Arista Records.

* * *

E a notícia que fecha coluna de hoje é quase uma colagem das anteriores: cinebiografia, Cannes e Che Guevara. Explico: além de Diários da Motocicleta, outro filme sobre Guevara está sendo produzido, só que desta vez enfocando os seus anos como guerrilheiro. O projeto estava nas mãos do competente e recluso Terrence Malick, diretor de Além da Linha Vermelha e Dias do Paraíso. Mas Malick, aumentando sua fama de pessoa inconstante, resolveu desistir do filme e entregou o cargo para o produtor Steve Soderbergh – que, pra quem não lembra, ganhou a Palma de Ouro em Cannes por sexo, mentiras e videotape. Che terá Benicio del Toro no papel-título, além das participações de Javier Bardem e Franka Potente e, ao contrário do filme de Walter Salles, será falado em inglês. Sei não, mas acho que vem aí outra pasteurização latina no estilo de Frida. É esperar pra ver.

Fábio Leal @ 3:44 AM

quinta-feira, abril 08, 2004

quinta-feira passada foi o dia da mentira. eu nem tinha ânimo, nem força pra escrever, e isso é bem verdade.

hoje é quinta-feira de semana santa. e ai, meu deus, sinceramente, uma das coisas que mais me afastavam do jornalismo cotidiano era isso, esse prazo, essa coisa do 'ter que escrever', independente de qualquer outra coisa. talvez, eu, menina boba, ainda com a visão romântica de quem sente cada coisa que escreve, nunca se acostumou com a idéia de escrever por osmose, por hábito, sob tortura, ou na pressão do dead line.

dia desses, numa mesa de bar, o amigo chico comentou algo sobre essa assiduidade semanal dos textos do 'sete dias'. a determinação obrigatória de se ter algo escrito no dia tal da semana, e falou que havia sentido uma queda qualitativa em alguns textos quase que como uma consequência direta dessa obrigação. eu pensava muito isso nos dias da faculdade de jornalismo. nem sempre o jornalista iria poder oferecer um bom texto ao seu leitor. haveria dias em que estaria de saco cheio, acordaria com dor de barriga, teria brigado com a namorada, ou, simplesmente, por um dia que fosse, desejaria nunca mais sair da cama. mas ainda assim, teria que se levantar, chegar à redação, dar os telefones do dia, ir à rua, se necessário, e escrever seu texto todo bonitinho.

talvez por isso o jornalismo diário seja tão sem graça. mas não levem a mal. decerto, um jornal que só funcionasse quando seus jornalistas estivessem afim de escrever não funcionaria, mas essa esquematização do ofício jornalístico para mim, traria sim a consequência de não necesariamente um texto ruim ou insosso, mas de uma estrutura de texto já consagrada e de certa forma já legitimada como sendo texto de jornal e também não necessariamente ruim por isso. como numa fórmula de bolo, em que o cozinheiro tem os ingredientes (no caso do jornalista seriam os fatos, as idéias, os personagens, entre outros elementos) e teria que ir dosando de acordo com a metologia da receita que se encerra em quantas xícaras de quê, quantas colherinhas de açúcar daquilo e como vai ao forno. dessa forma, o jornalista só teria que arranjar tudo bem direitinho para que o bolo saísse fofo. e o bolo pode sair muito bom é verdade, mas é sempre o mesmo bolo, no fim das contas.

analisando pelo lado do se ter que escrever todo dia, impiedosamente, essa fórmula seria uma maneira até, quem sabe, de preservar o jornalista, que poderia pegar os dados da história e transformá-la rapidamente para o formato do texto para jornal. a estrutura do texto jornalísitco diário e impresso é uma estrutura que povoa um certo imaginário sobre o que é ou não jornalístico (já imaginou a história de chapeuzinho vermelho sendo contada por um jornalista?). é essa estrutura que muitas vezes legitima um texto como sendo eficaz e adequado para sair estampado no jornal, mesmo que muitas vezes não se tenha tido uma boa apuração, e o texto chegue a cair na mesmice e nada de novo se acrescente. por exemplo, vocês já notaram que todos os anos no carnaval "a folia toma conta das ruas"?

a estrutura do texto em si, não impede que o texto seja bom, mas anula, de certa forma, a exploração de outras narrativas e maneiras para se conseguir obter uma história, uma boa informação, ou um serviço realmente útil à população.

e para quem não estava conseguindo sair do primeiro parágrafo, acho até que o texto já acabou. acabou? por enquanto, acabou. na próxima coluna espero começar com as entrevistas prometidas. até lá.

p.s.:já deu pra perceber que não estou muito para escrever hoje?


simone jubert @ 4:21 PM

terça-feira, abril 06, 2004

Quem tem birra de Fernanda Young?
por Jorge Wakabara

"Hoje, pela primeira vez, desde o dia em que chorou por querer comer o livro em suas mãos, retorna a observá-lo. Não mais a capa, mas as palavras, amontoadas em sua perfeição. Senta-se na poltrona próxima à mesa de trabalho e passa a folhear o livro, atrás de marcas de sua presença ali. Um risco de caneta embaixo de uma das linhas. Exclamações de beira de página. Às vezes - muito raramente faz isso num livro alheio - comentários. Encontra tudo isso. Encontra a ela. No que ela acreditava ao ler essa obra. O que ela achava necessário ser destacado"
Trecho de "Pessoas dos livros", de Fernanda Young

Era uma vez uma escritora chamada Fernanda Young que até vendia bastante. Ela também fazia uns roteiros de filmes e programas de TV - afinal, a gente tem que ganhar a vida. Mas o "defeito" dessa escritora é que ela sempre foi meio boca-aberta - e tem gente que diz que escritor tem é que se isolar e escrever, ponto, tipo Dalton Trevisan. Fernanda Young foi se "meter a besta" e virou uma das apresentadoras do Saia Justa - e aí, adivinha, virou moda falar da Fernanda Young. Saiu reportagem em tudo quanto é jornal falando dela - principalmente na Folha, que adora pegar uns "zé cristinho" pra malhar e gerar mais notícia e... Vem cá. Você, que NUNCA LEU Fernanda Young... leria?

(Ai, leitores, já vou avisando que isso é só uma pergunta, então não vejam nada além disso, não quero convencer NINGUÉM a ler, TÁ??? SOU INOCENTEEEE - e obviamente tô afinzaço de provocar vocês. HEH.)

Peguemos um livro específico: Pessoas dos Livros. É o penúltimo. Livro escrito por Mulher, mesmo. Na temática, no mergulho no ying. Tem muito de Marcia Denser - não chega a ser uma Marcia Denser, com todas as suas pequenas navalhadas, mas OLHA, não é que a Fernanda Young NÃO FALA BESTEIRA QUANDO ESCREVE??? Pelo contrário, ela é uma escritora simpática, que gosta dos seus personagens - eles são carentes, assim como nós somos, e passam por conflitos/dialéticas/contradições. Não é um livro que muda a vida do leitor, mas também não chega a ser um livro sem conteúdo, vazio ou raso. Fala sobre uma escritora com bloqueio criativo e em meio a uma crise conjugal - um momento crítico que permite uma série de fluxos de consciência e questionamentos a respeito de escolhas e valores que já não se encaixam mais. Dois outros livros bem interessantes dela, na minha opinião, são "Vergonha dos pés" (o primeiro publicado) e "Carta para alguém bem perto", talvez o que mais tenha me chamado a atenção na época que eu li. "Carta para alguém..." é mais denso e traz uma aura de delicadeza em torno da personagem principal, que justamente faz cartas para alguém bem perto - duh - e sofre, se desorienta, precisa de movimento em sua vida. Também dei uma olhada em "O efeito urano", o último, e não gostei muito, achei pedante, com uma linguagem muito rebuscada que não deu certo: o livro tornou-se maçante. Quem sabe Fernanda já estava dominada pela necessidade de falar coisas pseudo-complicadas, vide GNT? BOM, de qualquer forma, a escolha é sua. Você pode malhar a moça sem conhecimento de causa - só pelo que ela diz nos programinhas. Ou você pode lê-la e falar mal/bem dela como escritora. Diga que não pode perder tempo lendo livro bobo, diga que não tem paciência pra "obras menores", diga qualquer coisa... mas não vem dar palpite sem ter lido, HEIM??? Porque isso, DESCULPAAA, é coisa de gente burra.

Obras publicadas:
Vergonha dos pés - Ed. Objetiva
A sombra das vossas asas - Ed. Objetiva
O efeito urano - Ed. Objetiva
Carta para alguém bem perto - Ed. Objetiva
As pessoas dos livros - Ed. Objetiva
Os melhores momentos de Os normais - Ed. Objetiva (com Alexandre Machado)

Fábio Leal @ 8:36 AM

domingo, abril 04, 2004

Ana Paula Padrão: cabo eleitoral

Foi no último dia 15. O auditório estava lotado. Eu fui um dos “felizardos” a ganhar o convite, por sorteio. Nem sabia ao certo do que se tratava, mas resolvi ir ver a palestra da idolatrada âncora da Rede Globo, Ana Paula Padrão. Ao menos, foi isso que disseram que eu ia ver.

Só depois fiquei sabendo que ela viria ao Recife para falar sobre desarmamento. O evento era o lançamento do site Brasil Sem Armas. Segundo consta lá, “o Movimento Brasil Sem Armas é uma iniciativa nacional que reúne diversos representantes da sociedade civil, organizações não-governamentais e entidades de governo” que, “por meio de ações conscientizadoras, [...] visa mobilizar os brasileiros para a proibição do comércio de armas e munições no país”.

Na mesa, estavam, além da jornalista, o coordenador geral do Movimento (sic), Murilo Cavalcanti; o secretário de Defesa Social de Pernambuco, João Braga e um representante da ONG Viva Rio, cujo nome não me recordo. Estavam presentes também alguns políticos, dentre eles o deputado estadual Pedro Eurico. Nenhum deputado da oposição.

Durante várias horas, foram discutidos o papel dos meios de comunicação no combate à violência, a glorificação dos bandidos pela TV, a mobilização da sociedade em torno da causa, falsas interpretações estatísticas, mitos e verdades sobre a circulação de armas no país e a influência das videocassetadas na formação de indivíduos violentos. O público participou através de perguntas escritas; os políticos e outras personalidades ilustres, no entanto, iam direto ao microfone. Houve também sorteio de camisetas com o slogan do Movimento. Uma festa.

E daí?

O que eu só vim saber depois é que o tal coordenador geral do Movimento (sic) será candidato a vereador nas eleições municipais desse ano. Aliás, quem quer que tenha passado mais de 15 minutos no Recife nas últimas semanas se deparou com pelo menos um outdoor do sujeito, com sua foto estampada ao lado esquerdo e dizeres do tipo “Fernando de Noronha mais limpa conservada! Valeu, Murilo!”, “Paz é básico!”, ou qualquer coisa semelhante.

Uma amiga minha me contou que a iniciativa do tal Murilo (segundo ela, um “empresário da noite” bem sucedido) de ser candidato só surgiu após o seu engajamento com o movimento pelo desarmamento. Mas não me diga! Longe de mim acreditar que uma causa tão nobre, a paz, pudesse ser abraçada por oportunismo ou interesse eleitoreiro!

Estranho é que Murilo esteja ligado às mesmas forças políticas que estão no poder em Pernambuco, enquanto o estado atinge os atuais níveis de criminalidade, sendo, proporcionalmente, um dos mais violentos da federação. Se a motivação política dele é posterior ao abraço da causa do desarmamento e ele está do lado do governo, eu suponho que a política de segurança pública do estado, para ele, esteja OK.

Caímos na isca da campanha do desarmamento para ser submetidos a mais uma peça de marketing político. Eu e as tietes de Ana Paula Padrão, que tiraram fotos e mais fotos com o ídolo e deixaram o recinto logo após sua fala.


Haymone Neto @ 11:13 PM

sexta-feira, abril 02, 2004

Just like Fred Astaire

No finalzinho de 1996, Woody Allen lançava um novo filme. Até aí, nada de extraordinário, já que o cineasta lança um filme por ano desde muito tempo, quase todos girando em torno do tema neurótico-tem-problemas-amorosos. Todos Dizem Eu Te Amo não seria diferente, não fosse o fato de o neurótico em questão cantar – e todos os personagens à sua volta também. Não, não se tratam de personagens cantores, como a Annie Hall criada pelo próprio Woody. Em Todos Dizem..., as pessoas começam a cantar do nada – quando estão tristes, quando estão alegres, enfim, estamos diante de um verdadeiro musical. Julia Roberts, Edward Norton, Goldie Hawn, Tim Roth e até o próprio Woody Allen soltam o gogó sem o menor pudor. A única exceção é Drew Barrymore que, bancando a estraga-prazeres, pediu para ser dublada. Woody não sabia, mas aí estava a semente de um revival dos musicais no cinema.

No Festival de Cannes de 2000, o polêmico Lars von Trier chega à Riviera Francesa com Dançando no Escuro, um musical protagonizado por ninguém menos que Björk e contando ainda com Catherine Deneuve, estrela do primeiro filme totalmente cantado, Os Guarda-Chuvas do Amor. Assim como Guarda-Chuvas, Dançando no Escuro levou a Palma de Ouro – sem falar no prêmio de melhor atriz para Björk.
Se o filme de Von Trier era uma homenagem bizarra aos musicais, no ano seguinte Cannes trouxe um exemplar que reverencia não só os musicais hollywoodianos como também a música pop: Moulin Rouge. O filme dividiu crítica e público, mas provou aos executivos dos grandes estúdios que produzir um musical poderia, sim, ser algo rentável. Pouco mais de um ano depois, Chicago, versão do espetáculo de Bob Fosse para a Broadway, ganhava não só as telas de cinema, mas também centenas de milhões de dólares e cinco Oscars.

E agora? O que vem por aí?

Sendo “atriz” e “cantora”, era de se estranhar que a dona da bunda latina mais famosa do mundo, J. Lo, não investisse num filme que unisse os seus predicados. Pois bem, a ex-noiva de Ben Affleck vai cantar, dançar e representar (ao mesmo tempo!) em não um, mas dois filmes. Em American Darlings, ela vai dividir a cena e os vocais com Nicole Kidman – que volta a cantar depois de Moulin Rouge – numa parceria no mínimo estranha. Já em Shall We Dance, refilmagem do japonês Dança Comigo?, J. Lo vai arriscar alguns passos coladinha com Richard Gere (cuja cena de sapateado em Chicago precisou de dublês e truques de câmera para ser feita). Coadjuvando o casal, temos a respeitada Susan Sarandon.

Por falar em Susan Sarandon, ela parece realmente disposta a relembrar o seu início de carreira, quando participou do cultuado Rocky Horror Picture Show. Além de Shall We Dance, ela vai participar de outro musical, Romance and Cigarettes. Escrito e dirigido por John Turturro e produzido pelos Irmãos Coen, obviamente o filme tem um quê de bizarro: os atores Kate Winslet, James Gandolfini, Steve Buscemi e Christopher Walken, além da própria Sarandon, dublarão músicas de Irving Berlin, Tom Jones, Christopher Walken e até Nick Cave (!). Tem tudo para ser o cult do ano.

Fechando o nosso ciclo, voltamos a Cannes. O filme escolhido para encerrar o Festival desse ano é a cinebiografia de Cole Porter, De-lovely. O filme é protagonizado por Kevin Kline e conta com participações (aparentemente não muito) especiais de Natalie Cole, Elvis Costello, Sheryl Crow, Diana Krall, Alanis Morissette, Robbie Williams e Lara Fabian (!!!!). Só nos resta esperar para que as canções de Porter não sejam muito violentadas.

Fábio Leal @ 12:55 PM

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